sábado

Terror na escola

O massacre de Realengo reproduz no Brasil o horror dos ataques covardes a crianças indefesas


Confira a seguir um trecho dessa reportagem que pode ser lida na íntegra na edição da revista Época de 9 de abril de 2011.



A quinta-feira 7 de abril começou às 6 horas para Vitória Souza, de 10 anos. Levantou, comeu pão francês, tomou chocolate e vestiu o uniforme do colégio, a Escola Municipal Tasso da Silveira. Banho já havia tomado na véspera, com medo de se atrasar. Assim pôde dormir mais um pouquinho. A quinta-feira é dia de aula de educação física, uma de suas preferidas. Por isso a bermuda substituiu a calça jeans. Uma sorte na manhã de calor no outono carioca. Como sempre, saiu de casa, na Rua Três Corações, faltando 15 minutos para as 7 horas, quando começa a aula. Aluna do 5º ano, foi para o colégio de carro com o pai, Josuel, funcionário de um supermercado, e a mãe, Joana, acompanhante de idosos. Primeiro eles a deixaram na porta da escola e depois foram levar sua irmã, Juliana, de 15 anos, que estuda em outro lugar. Vitória desceu do carro, encontrou as amigas e foi direto para sua sala, no 2º andar.
A poucos quarteirões dali, na Rua Frederico Faulhaber, Milena dos Santos Nascimento, de 14 anos, também se arrumava para ir para a mesma escola. Na casa de dois cômodos, banheiro e cozinha, perguntou ao pai, o pedreiro Valdir, quando seu quarto ficaria pronto. Com três filhas – além de Milena, Tainá, de 15, e Helena, de 13 –, o chefe da família está construindo sobre a laje um novo aposento. É um quarto para as meninas. Milena, do 8º ano, sempre teve notas altas – apesar de pequenos escorregões na matemática. Na noite anterior, havia estudado a matéria. No ano passado levara um susto, ficando em recuperação. Dez minutos antes de a aula começar, saiu de casa com as irmãs, a pé. Deu um beijo na mãe, a empregada doméstica Josiane, e ganhou a rua.
Quando Vitória e Milena chegaram à escola, o policial Márcio Alexandre Alves, de 38 anos, sargento da PM, chegava a uma rua a duas quadras dali. Começava a trabalhar no auxílio de uma operação de trânsito, com dois colegas. Casado, pai de dois filhos – um menino de 12 e uma menina de 4 anos –, saiu cedo e deixou a família em casa para seguir mais um dia de rotina no combate ao transporte ilegal de passageiros, função de pouco risco em uma cidade violenta como o Rio de Janeiro.
Wellington Menezes de Oliveira, 23 anos, saiu de sua casa em Sepetiba, também na Zona Oeste do Rio. Levou cerca de uma hora para chegar a Realengo, bairro onde estudou, morou e ainda vive parte de sua família. Vestia calça social preta e camisa verde de mangas longas, além de sapato fechado. Levava uma bolsa. Cinco dias antes, havia cortado a barba longa que ostentava nos últimos meses. Chegou à escola Tasso da Silveira depois das 8 horas e, como ex-aluno, não teve dificuldade em passar pela entrada. Subiu do térreo para o 1º andar, entrou na sala de leitura e pediu seu histórico escolar à professora Dorotéia, de 68 anos, há 38 trabalhando no colégio. Ela o reconheceu. Reparou que ele estava bem-vestido. Mas informou que não poderia ajudá-lo naquele momento, pois estava ocupada com outra atividade. Dali, Wellington foi direto para uma sala de aula. A professora Leila Maria ensinava português aos alunos do 8º ano. “Estou aqui para dar uma palestra”, disse Wellington.
Pouco depois das 8h30 da quinta-feira, as meninas Vitória e Milena, o ex-aluno Wellington e o sargento Márcio se encontraram nos corredores da escola Tasso da Silveira. As garotas na condição de vítimas, Wellington como algoz e Márcio como herói de uma tragédia inédita na vida brasileira.

Da Redação com ÉPOCA

Nenhum comentário:

Postar um comentário